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luís fernando ferreira

O tempo lá de fora

em pouquíssimas linhas, mas é um conto. Chama-se O tempo lá de fora e é do mineiro Oswaldo França Júnior (1936-1989), extraído de seu livro As laranjas iguais.

“Dentro de minha casa o vento não penetrava, somente lá fora era frio e o vento assobiava. Mas veio alguém e abriu a porta. Meus pés gelaram e meus ouvidos escutaram os gemidos do vento.
Agora não posso deixar que fechem a porta. De que modo gozarei o calor e o silêncio de minha casa, sabendo como está frio e como venta além destas paredes?”

E como chove, poderíamos até acrescentar, mas o texto já diz o suficiente. O personagem anônimo foi removido bruscamente de sua “zona de conforto” e confrontado com a realidade externa, muito incômoda em comparação ao calor do lar. E, embora fique subentendido que ele poderia simplesmente fechar a porta e retomar sua paz anterior, decide não fazê-lo.

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Em meio a novas cenas de inundações e famílias desabrigadas no Estado, percebe-se de fato que a nova realidade climática veio para ficar, e é imprescindível estar preparado. Já não é mais possível alegar “surpresa” diante da recorrência de situações anunciadas há tempos por cientistas do clima. A natureza está invadindo nossas casas, escancarando portas e janelas, e é inútil fechá-las para não ouvir. Mesmo para quem agora se sente a salvo, no calor e no silêncio, toda sensação de segurança é momentânea.

Não existe “melhor” ou “pior” para a natureza. Os desastres não escolhem o perfil de suas vítimas. Não interessam sua cor, classe social ou se apoiam essa ideologia ou aquela. Nenhuma dessas divisões, que alguns consideram de suma importância na vida, tem qualquer valor. Pelo contrário, só atrapalham. Quanto mais rachaduras e fraturas há numa construção, mais frágil ela se mostra diante da intempérie.

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Ontem a Gazeta do Sul saiu com uma edição fora da programação, decidida em meio à urgência da situação das chuvas na região e no Estado. O jornal fez por bem cumprir seu papel: mostrar o que acontece, trazendo aos leitores o olhar e a palavra de quem está envolvido diretamente com os fatos.

O fato. Essa coisa que alguns dizem ser inatingível (às vezes, só para que possam fabricar a “verdade” que lhes convém). Assim, pode ser confortável permanecer em uma bolha onde o vento da realidade – ou da divergência, ou da incerteza – não entra jamais.

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Até se que se torna impossível, de uma forma ou de outra, ignorar o tempo lá de fora.

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